sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Cheiro de Natal

Sou de um tempo em que os preparativos para o Natal consumiam dias e dias no seio de minha família. Um tempo em que todos nós nos reuníamos para a tradicional ceia natalina e para o almoço de Natal.

Lembro bem desse tempo e um pequeno detalhe que seja já serve para me reportar àquela época feliz de minha existência. Seja uma música, um enfeite natalino ou mesmo um cheirinho tradicional de algo assando e pronto, lá vou eu para o túnel do tempo.

Esse período que antecede o Natal deixa meu espírito desprotegido no que diz respeito aos sentimentos que a saudade daquele tempo me dá. Basta fechar os olhos e recordar um daqueles dias e o nó na garganta aperta, os olhos marejam e a dor da perda aparece como um bólido.

Dia desses ocorreu algo parecido que me fez voltar imediatamente no tempo. Nas muitas andanças pelas lojas da cidade, em uma delas, a Marfim, um frasco com aroma de pinheiro foi o bastante para me remeter ao tempo em que eu ainda era um menino magricela de orelhas grandes.

Quando ouvi dizer que aquele spray tinha cheiro de Natal, imediatamente fui sentir o tal cheiro para ver se era mesmo aquele cheiro que eu sentia quando era criança. Esperava, ao sentir o aroma, voltar aos meus tempos de infância, mas aí me bateu a dúvida: o que seria para mim um cheiro de Natal?

Mais do que depressa me veio à mente o cheiro da leitoa assada ou do frango assando no forno. Eram esses os aromas que eu esperava sentir, que me faziam lembrar do Natal, não que cheiro de pinheiro não seja um aroma natalino, mas para mim cheiro de Natal é cheiro de carne assando no forno.

A Claudia, minha irmã mais nova, que estava comigo na loja, sem que eu dissesse algo, já foi logo dizendo que para ela cheirinho de Natal era aquele dos canudos recheados com doce de coco que minha mãe fazia. Claro que nada disso havia na fragrância daquele spray, mas aquele momento serviu para mostrar o quanto lembramos de nossa infância e das coisas boas que guardamos dela.

Tudo isso acabou. Não temos mais o jantar da véspera ou o almoço de Natal, na casa de nossos avós paternos, lá no alto da Vila Pereira. Mas as boas lembranças permanecem até hoje e um simples cheiro gostoso de assado já serve para trazer de volta todos os bons momentos daquele tempo em que eu era um menino magricela de orelhas grandes.

Hoje, meu Natal se resume à Mariane e eu. Mas nem por isso deixa de ser Natal. Guardo as boas lembranças no coração e procuro dar a ela tudo que tive de bom nessa época mágica que a espera pelo Natal e pelo Papai Noel representa para as crianças.

Faço isso porque um dia, lá no futuro, quero que ela se lembre de tudo isso e fique feliz em ter em seu coração as recordações dos tempos em que era criança. Assim, onde eu estiver, terei a certeza de ter feito a coisa certa ao dar a ela tudo aquilo que tive de bom nos meus tempos de criança.

Hum, que cheirinho de Natal! Será que é leitoa assada. Ou será que é canudo recheado com doce de coco? Só sei que deve ter alguém por aí preparando uma bela ceia de Natal. 

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Refém do passado

Sou de um tempo em que eu nem imaginava que um dia iria recordar aquele tempo e sofrer de saudade. Um tempo tão bom que hoje me sinto refém do passado, pois é nele que busco a força para viver o presente e sedimentar o caminho do futuro.

Se um dia Deus me desse permissão para voltar no tempo, acredito que a opção seria uma viagem por tantos momentos que marcaram minha passagem por esse mundo. Pediria a Ele a permissão para ser criança novamente, mesmo que fosse para ser um menino magricela de orelhas grandes outra vez, contanto que pudesse viver de novo a expectativa da espera pelo Papai Noel.

Como dói no cerne de minha alma olhar para a grande árvore de Natal de casa e lembrar a história de cada bola ou enfeite ali pendurado, principalmente os mais antigos, que fizeram parte de minha infância e que conservo até hoje. Olho para a espiga de milho, a violinha, o balão, o moinho ou para o Papai Noel já desbotado e volto no tempo sem ter vontade de retornar ao presente.

Corro os olhos pela bola verde, que estampa uma margarida pintada pela Vera, minha irmã mais velha, e me lembro de um certo galho de goiabeira, pintado com tinta purpurina e envolto em algodão, que era a nossa árvore de Natal. Que tempo bom, repleto de boas recordações e momentos inesquecíveis para esse coração apertado de saudade.

Por que será que a cada momento de lembrança desse tempo o nó que se forma em minha garganta aperta e me dá a sensação de estar usando uma gravata que me sufoca? Talvez seja por ter ciência de que nunca mais terei tudo isso de volta, por mais que queira.

Sei que não posso voltar no tempo, mas também sei que recordar tudo isso, apesar da dor que a lembrança causa, mostra que minha estadia por aqui foi proveitosa e repleta de bons momentos. E isso já é o suficiente para me encher de força para continuar em frente.

Sei que um dia, lá na frente, minha pequena Mariane, que agora dorme a sono solto e nem ouve as músicas que ouço e me transportam para a janela do meu quarto lá casa número 20 da Comendador João Cintra, vai ler tudo isso e descobrir que seu velho pai era um menino magricela de orelhas grandes, que adorava o Natal e Papai Noel, que era apreciador de boa música e que um dia teria muito o que contar. Quem sabe, um dia, Deus me conceda esse último pedido e, de mãos dadas com minha pequena companheira, eu possa viajar no tempo e mostrar a ela tudo isso.

Quem sabe a gente se sente debaixo da parreira de uva da casa de meus avós paternos, lá na João Pereira, e belisque os cachinhos de uva sem que minha avó Leonor perceba e aproveite para ligar a vitrola de minha tia Marly para ouvir Jhonny Rivers ou Chris Montez; ou na janela do meu quarto para apreciar as boas e inesquecíveis músicas da Rádio Mundial; ou ainda tenha um tempinho para contar as casinhas coloridas do Cubatão, sentados na janela do banheiro. Ou então chorar, recordando tudo isso nas histórias de minha vida que contarei, detalhe por detalhe, para que ela possa entender tudo e querer, junto comigo, viajar no tempo.

A quarta série ginasial

Faz tempo que isso não ocorre, mas um tempo atrás eu vivia sonhando que estava nas dependências da escola onde cursei o ginasial e também ...