Sou de um tempo em que todos os garotos sonhavam em brilhar com a
bola nos pés. Um tempo em que o futebol brasileiro estava em alta e ostentava
com méritos o título de melhor futebol do mundo.
Vivi esse tempo e, como todo e qualquer
garoto de minha época, sonhei em fazer sucesso como jogador de futebol. Claro
que era apenas um sonho de menino, mas pelo menos não deixei de sonhar.
Lembro bem que naquela época o Brasil
ostentava com orgulho as conquistas em três Copas. Era o ano de 1970 e eu, um
menino que já deixava de ser magricela de orelhas grandes, vivi aquilo que se
pode chamar de momento inesquecível.
Apesar de mirrado, eu tinha lá meus
predicados como jogador de futebol. Se não era forte, pelo menos corria e era
canhoto, um diferencial para os conhecedores do esporte bretão.
Lembro que fui convidado para treinar no
XI de Agosto, time que mais tarde daria origem ao Itapira Atlético Clube, e que
era comandado pelo Nelson Atala, homem forte do futebol local na época. Feliz e
orgulhoso participava de todos os treinos físicos na quadra do Lions e dos
coletivos no campo do ‘seo’ Hélio, hoje Pedro Bagini, no Centro de Lazer
Hideraldo Luiz Bellini.
Um belo dia veio a recompensa para tanto
esforço. O XI de Agosto faria um jogo amistoso contra o Nacional da Capital e
eu estava relacionado entre os que iriam para São Paulo.
Para mim, um menino sonhador, que já havia
realizado o sonho de jogar no sagrado gramado do ‘velho’ Chico Vieira, ao lado
do Parque Juca Mulato e de ter disputado várias partidas no novo Chico Vieira,
lá no alto da rua Duque de Caxias, que a gente chamava de ‘campo novo’ ou de
‘campão’, tal era o tamanho de seu gramado, aquela era a maior notícia de toda
a minha curta existência. Claro que eu sabia que não seria um jogador de
futebol profissional de sucesso, mas só de ter meu nome na lista já era uma
vitória.
As noites que antecederam aquele dia 13 de
setembro de 1970 foram intermináveis. Por minha cabeça passavam pensamentos que
me levavam àquele campo onde eram disputados os jogos do Campeonato
Dente-de-Leite, que a TV Tupi mostrava.
Só de pensar que iria pisar no gramado em
que, pela TV, vi jogarem amigos como Plininho Cremasco e Ike com a camisa do
meu Palmeiras, ou Luís Paulo e Dito Mário com a camisa listrada do próprio
Nacional, já era um sonho. Pensar que estaria no mesmo local em que a TV Tupi,
transmitia nas tardes de sábado os jogos do campeonato dente-de-leite, não me
deixava dormir.
O grande dia chegou e lá fomos nós para a
Capital de todos os paulistas. Eu, como fazia parte dos magrinhos, fui
acomodado no carrão do Plínio Cremasco. Os maiores, ou mais bundudos, como o
Neto Coloço e o Coradi, viajaram de Expresso Cristália para não ocuparem mais
espaço nos dois carros que levaram o resto do pessoal.
Perdemos de 5 a 3 para o Nacional, mas
apesar de jogar por oito ou 10 minutos, me senti realizado por pisar naquele
gramado do estádio da Comendador Souza, que tinha por baixo uma terra preta que
ficou grudada no solado de minha chuteira novinha, da marca Olé, de sola
branca, que ganhei de meus pais depois de tanto pedir, em substituição à outra,
conhecida como ‘cabeça de touro’, que me machucava os pés com seus pregos. Eu
sabia que aquele momento ficaria marcado em minha memória e que um dia seria
lembrado de uma forma ou de outra.
Depois do jogo e do lanche, uma outra
surpresa nos aguardava. Da Comendador Souza fomos direto para o Morumbi ver a
final do Campeonato Paulista.
Lá, naquele estádio que eu tinha visto
apenas pela TV, pude ver o São Paulo bater o Corinthians por 1 a 0, gol do
ponta-esquerda Paraná, e confirmar o título paulista daquele ano, conquistado
no jogo anterior diante do Guarani, em Campinas. Ver craques como Sérgio,
Jurandir, Forlán, Roberto Dias e Toninho Guerreiro de um lado, e Ado, Rivelino
e outros craques de outro foi mais um sonho para aquele menino que não tinha
por hábito ficar longe de casa.
Talvez pelos ensinamentos de meus pais e,
principalmente, pela austeridade como meu pai dirigia nossa família, ter
vislumbrado tantas coisas novas e vivido momentos inesquecíveis distante de
casa, fez com que aquele domingo fosse mágico para mim. Foram momentos que
nunca mais saíram de minha memória, apesar dos mais de 40 anos que se passaram.
O XI de Agosto acabou, mais tarde surgiu o
Itapira Atlético Clube, eu nunca me transformei em um grande craque dentro de
campo, mas pude gravar em minha história aquele momento mágico. Até hoje lembro
de todos aqueles momentos, como se tivesse vivido tudo aquilo no dia anterior,
tal a felicidade que aquele domingo me proporcionou.
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