Sou de um tempo em que cada pessoa tinha seu devido valor. Não
importava a importância dela para o contexto da sociedade, mas o que ela
significava na vida de cada um de nós.
Várias foram as pessoas que deixaram
marcas profundas em minha existência. Algumas pelos laços sanguíneos, como pai
e mãe, outras por estarem presentes em diversos momentos de nossas vidas e, de
uma forma ou de outra, representarem uma página em nosso livro da vida.
E é incrível como centenas de pessoas que
conhecemos passam como bólidos pela nossa vida e desaparecem na poeira sem
deixar rastro. De quando em quando reaparecem do nada e somem novamente num
piscar de olhos.
Outras, entretanto, estão sempre ali, como
parte integrante do nosso dia-a-dia. São figuras tão fáceis de se ver que
quando não as vemos é como se faltasse um pedaço da gente.
Desde que nasci e, principalmente a partir
de quando comecei a entender essa coisa complicada que chamamos de vida,
algumas pessoas estiveram sempre ao redor, preenchendo cada momento e traçando
as linhas pelas quais minha vida foi escrita. Lembro bem como se fosse hoje de
tantos vizinhos que já partiram desta para a que chamamos de melhor.
E, entre tantos e tantos que se encaixam
nesse contexto, há aqueles que não me saem da memória. Vira e mexe e algum
reaparece como que por encanto e me fazendo lembrar de algum detalhe curioso
dos tempos em que eu ainda era um menino magricela de orelhas grandes.
Coca é um desses personagens
inesquecíveis. Alegre, extrovertido, bem informado e palmeirense como eu,
sempre foi um companheiro de todas as horas.
Nos últimos anos de sua vida era ali no
portão da minha casa que ele gostava de se sentar para ver o dia passar. Era
sair de casa cedinho e lá estava ele, sentado naquele portão como se fosse um
guardião de todos nós.
Minha mãe, como de costume, também se
sentava naquele lugar e, invariavelmente, era com ele que batia longos papos.
Uma boa piada, um fato ligado ao futebol ou qualquer que fosse o assunto, desde
que não fosse política e ambos comungavam do mesmo pensamento.
A política era assunto proibido entre
ambos. Afinal, Coca era totonhista ferrenho e minha mãe tinha lá seus motivos
para não concordar.
Mas, tirando esse pequeno detalhe, de
resto os dois eram grandes amigos, assim como eu o tinha como um daqueles
amigos que se guarda para sempre na memória e no coração. Lembro bem de seu
jeito de brincar com as pessoas, sem que em algum momento ofendesse ou
irritasse alguém.
Não são raros os momentos em que fecho os
olhos e retorno aos tempos em que a casa número 20 da Comendador João Cintra
era minha moradia. Volto quase que sempre em pensamento ao local onde nasci e
vivi grande parte de minha existência.
E, embora saiba que nada será como antes,
deixo meus pensamentos vagarem por tudo que vivi naquele local. Em meus
devaneios vejo o Coca Venturini sentado ali no portão de casa como um guardião
de todos nós.
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