Sou de um tempo em que a José Bonifácio, rua central da cidade,
tinha o tráfego no sentido da praça. Um tempo em que as meninas da sociedade,
quando atingiam os 15 anos, participavam do tradicional Baile de Debutantes.
Um tempo em que tudo era mais romântico,
mais glamouroso. Um tempo em que o Clube XV de Novembro era frequentado pela
elite e nós, simples mortais, apenas ficávamos imaginando como seriam os
grandes acontecimentos que lotavam o salão do clube.
Lembro bem que estávamos no final da
década de 60, no ano de 69, e que as telenovelas da TV Tupi faziam sucesso.
Naquela época a transmissão ainda era em preto e branco e raras eram as casas
de classe média que possuíam um aparelho de TV.
Para quem pertencia às classes sociais menos
favorecidas eram poucas as opções de lazer. Lembro que as noites de sábado eram
preenchidas com uma sessão de cinema e, quando havia dinheiro, uma pizza no
Sebastião Bar ou no Cine Bar.
Eu ainda era um menino, de 11 ou 12 anos,
magricela e de orelhas grandes. Havia acabado de ingressar no ginásio e
começava a dar meus passeios em companhia de amigos.
Em uma dessas noites de sábado, depois de
saborear uma bela pizza no Sebastião Bar, que ficava no final da José
Bonifácio, onde atualmente está o Moyses Magazine, junto com meu primo Marcos
Papaléo e o amigo Antonio Carlos Crivelaro, um Fusca, último tipo, parou na
esquina da Paulista e o motorista nos chamou para indagar sobre seu destino,
pois estava perdido. Como eu estava mais próximo da sarjeta, debrucei na porta
do carro do lado do carona e abaixei para ouvir a pergunta.
Quando olhei para o rosto do motorista vi
que já o havia visto em algum lugar. Segundos depois percebi que ali, bem na
minha frente, estava ninguém menos que o astro da novela das sete.
Juca de Oliveira, o galã da época, em
carne e osso, estava ali, parado ao volante de seu Fusca, e precisava saber
como fazia para chegar à residência do Hildebrando Banzatto. Passado o susto,
ouvi a indagação e imediatamente ofereci nossos préstimos para ajudá-lo a
encontrar seu destino.
Mesmo sabendo que era só ele virar para a
direita e subir dois quarteirões e meio e já estaria em seu destino, fiz
questão de dizer que iríamos junto para ele não se perder. Afinal, não era todo
dia que um astro da TV estaria ali, na nossa frente, precisando de ajuda.
Meu primo e o Carlão se acomodaram no
banco de trás, sem amassar o paletó xadrez impecável, que ali estava na espera
do momento em que o galã iria vesti-lo para ser o paraninfo do Baile de
Debutantes. Eu, como sabia onde ficava a casa dos Banzatto – que ficava no
quarteirão de minha casa –, fui no banco da frente para indicar o caminho.
Claro que nossa aventura durou apenas dois
pequenos e míseros quarteirões e não tivemos a sorte de encontrar com algum
conhecido no caminho para botar banca. Mas só de estar ali, ao lado do galã da
novela das sete, já havia sido para nós algo fantástico.
O tempo passou e esse detalhe de minha
infância ficou guardado em um canto de meu baú de memórias, esquecido, deixado
de lado pela ação do tempo. Só quando o ator, já consagrado, decidiu comprar
uma propriedade rural em Itapira e passar a ser figurinha fácil nas ruas da
cidade é que fui me lembrar desse fato.
Hoje, tantos anos depois, mesmo tendo a
oportunidade de entrevistar e conversar com astros de TV, cantores renomados,
políticos influentes e craques da bola por causa de minha profissão, entendo
que aquele momento de minha infância foi muito mais importante no contexto de
minha vida. Nada se compara a emoção vivida naquele momento.
Juca de Oliveira já não é o galã de antes,
mas escreveu seu nome no mundo artístico como grande ator de cinema, TV e
teatro. Meu primo Marcos há pelo menos 20 anos não vejo.
O Carlão Crivelaro, hoje um renomado cirurgião-dentista e
articulista de mão cheia, continua sendo um bom amigo. Dia desses me lembrou
desse fato em uma manhã de domingo enquanto minha filha Mariane e seu neto
Rodrigo se divertiam nos brinquedos do Parque Juca Mulato.
O tempo é implacável com todos nós.
Ficamos mais velhos, os cabelos, quando resistem, são pintados de cinza, o
esqueleto já não suporta o peso dos anos, mas as memórias de tempos felizes
permanecem em nossa mente e são reavivadas a cada oportunidade que a vida nos
dá de relembrar os detalhes que construíram nossa existência.
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