Sou de um tempo em que a vida consistia em nascer, crescer, casar
e trabalhar para sustentar a família. Um tempo em que os recursos eram parcos,
mas de grandes e boas recordações.
Lembro bem que meu pai sempre foi um
trabalhador. Saía cedo de casa para o trabalho, voltava pro almoço e já rumava
novamente para a fábrica de móveis lá no final da avenida Rio Branco. E tudo
isso a pé.
Mesmo quando sua bronquite asmática
atacava, principalmente na época do frio, lá estava ele com um lenço protegendo
o nariz, tal qual um bandido de filmes de faroeste, enfrentando o pó produzido
pela serra que cortava a madeira que mais tarde se transformaria em peças de
mobiliário.
Cresci vendo esse filme e admirando meu
pai, não só por seu esforço, mas principalmente pela facilidade com que
transformava uma simples prancha de imbuia em um armário ou uma cama de casal.
Vez por outra eu o acompanhava até a fábrica e ficava vendo ele desempenhar sua
função de marceneiro.
Lembro de cada detalhe daquela fábrica de
móveis. Seus sete sócios – Ulysses Ravetta, Tila Avancini, Orlando Sartori,
Beti Bayod, Adilson Ravetta, Francisco Tossini e meu pai -, cada um em seu
banco de trabalho e os funcionários que ali trabalhavam. O Vicente Gomes, que
conheço desde menino e que foi meu amigo de infância, o Zé Pedro Oziliero, o
Camilo, o Pixorra e tantos outros que por ali passaram.
Tudo ali me fascinava, mas o que mais me
chamava a atenção era a arte e o talento do Chico Tossini, um mestre na arte de
entalhar a madeira e transformá-la em algo incomparável. Sua forma de trabalhar
com o formão ou cinzel e o martelo de madeira era algo de tirar o chapéu.
Tudo aquilo já ficou para trás, fazendo parte apenas da minha
infância e das recordações do tempo em que eu era um menino magricela de
orelhas grandes. Aquele fábrica de sonhos que sustentava sete famílias e dava
emprego para outro tanto de pessoas fechou suas portas e encerrou para sempre
um ciclo que guardo com carinho em meu baú de memórias.
Quando fecho os olhos e me voltou para o passado, ainda posso ver
meu pai em seu ambiente de trabalho naquela fábrica de sonhos e até sentir o cheiro
do pó da madeira, que exalava de suas roupas quando ele chegava em casa no
final da tarde. Exausto, mas feliz por ter cumprido mais um dia de sua árdua
tarefa de sustentar a família com dignidade.
Um comentário:
Olá, Humberto! Navegando por aí, vim parar aqui. Sorte minha, porque achei seus textos sensacionais! Também sou do tempo de várias coisas que vc relatou aqui.
Continue a escrever, certamente vc tem muitos casos pra contar. Abraço. Cláudio
Postar um comentário