quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Refém do passado

Sou de um tempo em que eu nem imaginava que um dia iria recordar aquele tempo e sofrer de saudade. Um tempo tão bom que hoje me sinto refém do passado, pois é nele que busco a força para viver o presente e sedimentar o caminho do futuro.

Se um dia Deus me desse permissão para voltar no tempo, acredito que a opção seria uma viagem por tantos momentos que marcaram minha passagem por esse mundo. Pediria a Ele a permissão para ser criança novamente, mesmo que fosse para ser um menino magricela de orelhas grandes outra vez, contanto que pudesse viver de novo a expectativa da espera pelo Papai Noel.

Como dói no cerne de minha alma olhar para a grande árvore de Natal de casa e lembrar a história de cada bola ou enfeite ali pendurado, principalmente os mais antigos, que fizeram parte de minha infância e que conservo até hoje. Olho para a espiga de milho, a violinha, o balão, o moinho ou para o Papai Noel já desbotado e volto no tempo sem ter vontade de retornar ao presente.

Corro os olhos pela bola verde, que estampa uma margarida pintada pela Vera, minha irmã mais velha, e me lembro de um certo galho de goiabeira, pintado com tinta purpurina e envolto em algodão, que era a nossa árvore de Natal. Que tempo bom, repleto de boas recordações e momentos inesquecíveis para esse coração apertado de saudade.

Por que será que a cada momento de lembrança desse tempo o nó que se forma em minha garganta aperta e me dá a sensação de estar usando uma gravata que me sufoca? Talvez seja por ter ciência de que nunca mais terei tudo isso de volta, por mais que queira.

Sei que não posso voltar no tempo, mas também sei que recordar tudo isso, apesar da dor que a lembrança causa, mostra que minha estadia por aqui foi proveitosa e repleta de bons momentos. E isso já é o suficiente para me encher de força para continuar em frente.

Sei que um dia, lá na frente, minha pequena Mariane, que agora dorme a sono solto e nem ouve as músicas que ouço e me transportam para a janela do meu quarto lá casa número 20 da Comendador João Cintra, vai ler tudo isso e descobrir que seu velho pai era um menino magricela de orelhas grandes, que adorava o Natal e Papai Noel, que era apreciador de boa música e que um dia teria muito o que contar. Quem sabe, um dia, Deus me conceda esse último pedido e, de mãos dadas com minha pequena companheira, eu possa viajar no tempo e mostrar a ela tudo isso.

Quem sabe a gente se sente debaixo da parreira de uva da casa de meus avós paternos, lá na João Pereira, e belisque os cachinhos de uva sem que minha avó Leonor perceba e aproveite para ligar a vitrola de minha tia Marly para ouvir Jhonny Rivers ou Chris Montez; ou na janela do meu quarto para apreciar as boas e inesquecíveis músicas da Rádio Mundial; ou ainda tenha um tempinho para contar as casinhas coloridas do Cubatão, sentados na janela do banheiro. Ou então chorar, recordando tudo isso nas histórias de minha vida que contarei, detalhe por detalhe, para que ela possa entender tudo e querer, junto comigo, viajar no tempo.

Um comentário:

Jan disse...

Como é gostoso ler o que vc escreve, vou aproveitar e colocar na minha rotina, uma leitura por dia!!!!
E as casinhas coloridas do Cubatão....

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