Sou de um tempo em que viajar no tempo era coisa de seriado de TV.
Hoje percebo o verdadeiro significado dessa expressão a cada vez que minha
mente me remete a fatos e passagens de minha infância.
Quando eu ainda era um menino magricela de
orelhas grandes o seriado Túnel do Tempo estava na moda. Apesar de não ter
aparelho de TV em casa, eu sempre dava um jeitinho de assistir no sobrado dos
Secchi Franco, local de encontro da criançada para a sessão de TV do início da
noite.
Talvez por ainda ser criança e ter pouco
ou quase nada para relembrar, não entendia como minha avó Carmela e minha mãe
ficavam rememorando tantos fatos do passado. E a resenha era ainda maior quando
minha tia Nira vinha da longínqua Álvares Machado para uma temporada em casa. Ávida
por notícias de pessoas com as quais conviveu em sua juventude, minha tia, alegre
e extrovertida, era uma companhia agradável e muito esperada por todos nós.
Como residia muito longe de Itapira, tia
Nira visitava os familiares uma vez por ano, se muito. E o tempo que passava
conosco era uma festa, com verdadeira peregrinação para rever familiares e
conhecidos.
E foi em um desses passeios que ocorreu
uma cena inusitada, que ficou gravada até hoje em minha memória. Tudo se passou
em uma viagem de trem até Martim Francisco, última parada antes da pequena
viagem de charrete até a Fazenda São Miguel, onde residia a família de minha
tia Jacira.
A viagem era curta, mas havia a
necessidade da troca de trem em Mogi Mirim. A famosa baldeação.
Era preciso descer de um trem e subir em
outra composição. E, para tanto, havia a necessidade de atravessar por entre os
trilhos.
Sempre bem arrumada, minha tia Nira acabou
enroscando o salto do sapato no dormente dos trilhos e o tombo foi inevitável.
Apesar do contratempo, seu bom humor falou mais alto e, sentada no meio da
linha férrea, deu boas risadas da situação, até se levantar e prosseguir pelo
trajeto até o trem que nos levaria até Martim.
Hoje, já com o baú de memórias abarrotado
pelo tempo que passou, posso entender o valor de tudo o que temos de bom para
relembrar. E é num simples fechar de olhos que viajo no tempo. Tão rápido
quanto a passagem dos personagens daquele antigo seriado, que viajavam no túnel
e caíam em um ponto do passado.
Mas, diferente das aventuras irreais
vividas pelos personagens do seriado, minha viagem é recheada de lembranças.
Lembranças como essa do tombo hilário de minha tia. Um fato simples, mas
marcante, pois retrata um tempo feliz de minha infância.