terça-feira, 5 de março de 2019

A mulher que abria portas


Quem conheceu minha avó Carmela sabe do que se trata. E com certeza vai concordar comigo.
Nascida no último ano do século 19 em Nápoles, na Itália, minha avó Carmela Galli veio para o Brasil com apenas três anos de idade naquela época em que a imigração italiana era muito grande devido por causa da promessa de emprego e prosperidade do período pós escravidão.
Embora tenha vindo muito nova para o Brasil, conservava a língua italiana e era através dela, muitas vezes, que se comunicava com minha mãe. E foi assim que eu também acabei aprendendo um pouco do idioma da Velha Bota.
Vó Carmela ficou viúva muito cedo, meu avô Antonio Papaléo, um espanhol natural de Barcelona, faleceu acometido por um câncer em 54, anos antes de eu vir ao mundo. Mas, com sua força incomum ainda viveu por mais 12 anos, apesar de sofrer da mesma doença que ele.
Tive o privilégio de conviver com ela por apenas alguns anos. Quando eu tinha nove anos ela foi embora aos 67 anos.
Mas, nesse curto espaço de tempo pude entender o quanto valia a força de uma pessoa, seu dom de ajudar as pessoas e mostrar capacidade para tudo, embora nunca tivesse frequentado os bancos escolares. Sem dúvida, ela era uma pessoa incomum, muito além do tempo em que permaneceu por aqui.
Sempre pronta a ajudar, fosse quem fosse o necessitado, lá estava ela abrindo portas e resolvendo problemas. Quantas e quantas pessoas foram encaminhadas ao Hospital das Clínicas, na Capital paulista, graças ao seu conhecimento.
Os laços de amizade que mantinha com o médico Eurycledes de Jesus Zerbini abriam as portas daquele que era o maior hospital do país na época. Era só ela acompanhar o paciente até lá e a internação era providenciada.
Por aqui também fazia das suas. Lembro bem de um dia em que a Marta Ziliotto, que trabalhava na Cal Fortaleza lá nos Prados, havia perdido a condução que a levaria para o trabalho e minha avó, mais que depressa parou o primeiro carro que apareceu em direção da Avenida Brasil, sem se dar conta que era o rabecão da funerária.
Mesmo sem ser eleitora, por não ter cidadania brasileira e diploma escolar, era adhemarista convicta. Chegava a brigar, no bom sentido, para defender o político Adhemar de Barros, que chegou ao posto de governador do Estado.
Posso afirmar que embora tenha tido muito pouco tempo para conviver com ela, aprendi muito com aquela mulher de passos rápidos e pensamentos velozes. Aprendi que estender a mão para quem precisa é algo que devemos sempre praticar.
Já se vão mais de 50 anos de sua passagem para o andar de cima, mas para aqueles que a conheceram ela sempre vai estar em evidência. Seus atos jamais serão esquecidos por quem viveu aquele tempo.

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