Alguns lugares marcam nossa vida e nunca mais saem de
nossa memória. São aqueles lugares em que passamos momentos inesquecíveis e que
gostaríamos de poder rever.
E um desses lugares é a Fazenda São Miguel, no distrito
de Martim Francisco, em Mogi Mirim, de propriedade do Brás Cavenaghi. De lá
guardo recordações agradáveis de minha infância e que nunca serão esquecidas.
Quando eu ainda tinha seis ou sete anos, nosso passeio de
final de semana, quando dava, era ir para a fazenda onde meu tio Osório
Severino era o administrador. Casado com tia Jacira, irmã da minha mãe, como
bom mineiro, ele sempre tinha uma boa história para contar.
O passeio começava logo nas primeiras horas da manhã de
sábado. Antes de clarear o dia já estávamos na estação para esperar o trem que
nos levaria até Mogi Mirim e, de lá, em outra composição, para Martim
Francisco.
Minha avó Carmela, que sempre ia conosco, chegava bem
antes na estação. Com medo de perder o trem, que saía as seis, quando era
quatro e meia ela já descia a José Bonifácio em desabalada carreira.
Da estação de Martim até a fazenda era outro trajeto e
este era feito na carrocinha guiada pelo primo Beto, filho mais velha da tia Jacira.
Mais tarde, quando já dirigia, ele ia com o fusca verde claro do tio Osório e
levava a tropa para a fazenda.
Como toda fazenda, a São Miguel possuía belos lugares. A
casa da fazenda, de construção antiga, mantinha os traços originais e só era
ocupada quando os proprietários estavam presentes.
Meus tios e os filhos José Roberto e Janete moravam na
casa destinada ao administrador. Apesar de simples, possuía três quartos, uma
sala ampla, um escritório e a cozinha, em um plano mais baixo, que tinha uma porta
que dava acesso ao terreiro e ao banheiro.
De frente para a casa existia um pomar com todo tipo de
frutas. Desde laranjas de várias espécies até castanha portuguesa e muitas até
mesmo desconhecidas para nós, como uva japonesa e uma fruta que chamávamos de
pele de moça, mas que mais tarde descobrimos que o verdadeiro nome era lichia.
Do lado direito da casa havia o paiol, um quarto para
guardar as selas dos cavalos e outro onde dormia um dos empregados da fazenda.
Lembro que bem de frente para a casa existia uma árvore frondosa e embaixo dela
um banco de madeira.
Lá atrás, depois do terreiro, havia um galinheiro e um
piquete com os porcos. Descendo um pouco mais havia o curral e era lá que íamos
cedinho no domingo tomar leite tirado na hora.
Ir para a fazenda era uma festa, um passeio que
esperávamos com ansiedade. E quando chegava a hora de voltar de trem eu já
ficava contando os dias para retornar.
Guardo na memória esses bons momentos passados naquele
lugar e lembro cada espaço da fazenda, os sons noturnos, o despertar do galo, o
sabor do leite e das frutas tiradas do pé. Cada passeio a cavalo, cada detalhe
da estrada, que passava por baixo dos trilhos do trem e cortava um pequeno
riacho.
A vida nos impõe obstáculos, coloca diante de nós em
determinados momentos problemas que acreditamos serem intransponíveis e nós
passamos por cima de tudo. E isso só é possível graças à força que momentos
como esses nos oferecem.
É assim que seguimos nesse mundo. Guardando os bons
momentos como combustível para transpor os obstáculos que aparecem pela frente.
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